segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

No STF, clima é contrário à intervenção



Ministros da mais alta corte de Justiça do país avaliam que a crise política não reúne as condições para que seja nomeado um interventor para o Distrito FederalDenise Rothenburg
Quem se dispuser a conversar reservadamente com os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) verá que, na avaliação de muitos, o atual estágio da crise que jogou por terra o governo de José Roberto Arruda ainda não é cenário para uma intervenção federal no Distrito Federal. Pelo menos quatro deles, quando perguntados, são unânimes em listar os estágios que faltam para que a intervenção seja adotada. Por isso, avisam que, do ponto de vista jurídico, o clima na mais alta Corte do país não é de determinar, de pronto, a nomeação de um interventor para o Distrito Federal, como quer o procurador-geral da República, Roberto Gurgel. No estágio atual, calculam ministros consultados, o governador em exercício Paulo Octávio vem cumprindo as suas obrigações constitucionais. E, ainda que deixe o cargo mais à frente, seu substituto seria o presidente da Câmara Legislativa, no caso, o deputado Wilson Lima (PR). Ainda que Lima não consiga se sustentar, o atual presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT), Níveo Gonçalves, assumiria e convocaria uma eleição indireta em 30 dias. Mas é justamente nessa eleição indireta que está o nó. Políticos têm avaliado que a Câmara Legislativa do DF está tão contaminada pelas denúncias de corrupção que não teria meios de eleger alguém fora da base do governador José Roberto Arruda. Do ponto de vista jurídico, no entanto, não é possível fazer essa previsão. Câmara Legislativa Os ministros consideram que, embora a Câmara Legislativa esteja atrasando as investigações da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) e a análise dos processos de impeachment apresentados desde o ano passado contra o governador José Roberto Arruda, não se pode presumir desde já que os deputados não teriam condições de eleger um governador acima de qualquer suspeita. Juridicamente, mesmo com pelo menos oito dos 24 deputados envolvidos no escândalo, não dá para concluir que, se houver a necessidade da eleição indireta, a Câmara Legislativa não cumpriria com as suas obrigações — embora, politicamente, deixe a desejar do ponto de vista das investigações. A essa análise, os ministros juntam ainda um ponto que consideram principal: o espírito dos constituintes de 1988 foi o da não intervenção federal nos estados. Tanto que o Artigo 34 começa assim: "A União não intervirá nos estados nem no Distrito Federal, exceto para: As excepcionalidades listadas no texto incluem o cumprimento de princípios constitucionais, tais como, a forma republicana, sistema representativo e regime democrático, direitos da pessoa humana, autonomia municipal, e prestação de contas da administração direta e indireta". Enquanto o DF estiver com um governo funcionando, avaliam alguns ministros, não há por que adotar a medida mais drástica, que seria a intervenção. Prazos O pedido de intervenção federal foi feito na última quinta-feira pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, no mesmo dia em que foi decretada a prisão e o afastamento do governador José Roberto Arruda. Gurgel deu cinco dias úteis para que o Governo do Distrito Federal apresente a defesa. O governador em exercício Paulo Octávio, que não é citado no pedido de intervenção, já determinou ao procurador-geral do DF, Marcelo Galvão, que prepare a defesa. O documento será entregue ao presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, na próxima sexta-feira. Caberá, então, ao próprio ministro Gilmar analisar o pedido e levar ao pleno do STF. A data da votação ainda não está definida, mas os ministros do STF estão preocupados com o tema. Muitos esperavam não ter que decidir sobre um assunto tão delicado, especialmente neste momento em que as condições jurídicas de falência de todas as instituições não está posta. Por isso, vão passar os próximos dias estudando muito bem o assunto. Antes do carnaval, por exemplo, assessores de todos os gabinetes correram à biblioteca do STF para retirar livros técnicos sobre casos de intervenção, uma experiência que a democracia brasileira não experimentou, pelo menos, nos últimos 25 anos. Um dos títulos mais procurados foi o Intervenção nos Estados, do ministro Ricardo Lewandovsky. Na sexta-feira, não havia mais um exemplar disponível para consulta na biblioteca do Supremo. Fique por dentroVeja como funciona a decretação de uma intervenção federalO que é? Prevista no texto da Constituição de 1988, a intervenção federal é a suspensão temporária da autonomia política de alguma unidade da Federação. Quando se aplica? Aplica-se em caso de defesa da ordem pública, das finanças públicas, da unidade nacional, dos poderes executivos e legislativos locais. Quem pode pedir? Os poderes Executivo, Legislativo, Judiciário e ministérios públicos estão aptos a pedir pela intervenção federal. Como corre o processo? O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) recebe o pedido e notifica a unidade da Federação para apresentar os esclarecimentos. A Procuradoria-Geral do estado em questão apresenta uma posição. Com as respostas, o STF estuda a matéria, elabora um voto e convoca o plenário para apreciar o assunto. Se aprovado, o processo vai para a Presidência da República, que determina, por meio de decreto, um nome e o prazo para intervenção. O Congresso Nacional aprecia os termos e homologa o nome. MemóriaVinte anos de autonomia
Nos 30 primeiros anos de Brasília, os eleitores locais não puderam votar para governador do Distrito Federal. Muito menos para deputado distrital. Essa decisão partia da União. Cabia ao presidente da República escolher o administrador da cidade. Procedimento idêntico aos outros distritos municipais e estaduais, cujos chefes são escolhidos por prefeitos e governadores, respectivamente. O arquipélago de Fernando de Noronha, por exemplo, é um distrito estadual de Pernambuco. O governador Eduardo Campos é quem nomeia o administrador. Desde sua fundação até 1990, ano em que foi eleito o primeiro governador por voto direto no DF, a nova capital foi chefiada por 16 pessoas. O primeiro deles foi o engenheiro Israel Pinheiro, que participou do processo de construção de Brasília e permaneceu no cargo de 21 de abril de 1960 a 31 de janeiro de 1961. Hélio Prates (de 1969 a 1974) e Elmo Serejo de Freitas (de 1974 a 1979), que hoje nomeiam prédios e avenidas de algumas regiões administrativas do DF, também foram nomeados. O último foi Wanderley Vallim da Silva, que ficou de 9 de março de 1990 a 15 de março de 1991. Os assuntos tributários, orçamentários, serviços públicos e de pessoal da administração do DF eram decididos por uma Comissão do Distrito Federal no Senado, conforme previu a Constituição de 1967. A autonomia política do DF veio com a promulgação da Constituição Federal de 1988. A Carta Magna previu que a autonomia entraria em vigor a partir de 1º de janeiro de 1991. A primeira eleição pelo voto direto, tanto para governador quanto para deputados distritais, ocorreu em 1990. O vitorioso foi Joaquim Roriz, que tomou posse em 1º de março do ano seguinte. (Daniel Brito)
Fonte: Correio Braziliense

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