terça-feira, 6 de julho de 2010

Contas de campanha eleitoral: uma mera formalidade? - Por Edirlei Souza

UM PRESENTE PARA OS TRANBIQUEIROS. A prestação de contas de campanha já foi uma grande preocupação dos políticos. Agora, com a chamada “Mini Reforma Eleitoral” (Lei n. 12.034/2009), claramente prejudicial aos anseios da sociedade, a preocupação já é coisa do passado. É isso mesmo, pelo menos quanto ao tema prestação de contas. Tivemos um retrocesso. Senão vejamos.

Em 2008, o TSE por meio de uma de suas salvadoras resoluções, afinal, sempre foi assim que supriu a omissão dos tais legisladores por excelência, trouxe um comando normativo que deu o que falar naquelas eleições. Estamos falando do § 3º do art. 41 da Res. N. 22.715/2008 (Sem prejuízo do disposto no § 1º, a decisão que desaprovar as contas de candidato implicará o impedimento de obter a certidão de quitação eleitoral durante o curso do mandato ao qual concorreu).

Como no Brasil ainda prevalece o ditado de que ‘tudo que é bom dura pouco’, não foi diferente com essa regra tida como ‘agora pegamos os espertinhos’. Eles mesmos, os tais legisladores, aqueles para quem a regra do TSE surtiria efeito, aproveitaram a oportunidade da Lei da Reforma Eleitoral, onde o assunto carro-chefe e mais badalado era a propaganda na internet, e lançaram uma regra para se livrarem da armadilha saudável arrumada pelo TSE para quem tivesse as contas rejeitadas.

Pois é, fizeram inserir na Lei das Eleições um dispositivo visando, única e exclusivamente, invalidar a norma inserta na Res. 22.715 do TSE. O escape que tá na lei diz assim: “A certidão de quitação eleitoral abrangerá exclusivamente a plenitude do gozo dos direitos políticos, o regular exercício do voto, o atendimento a convocações da Justiça Eleitoral para auxiliar os trabalhos relativos ao pleito, a inexistência de multas aplicadas, em caráter definitivo, pela Justiça Eleitoral e não remitidas, e a apresentação de contas de campanha eleitoral”. (§ 7o do art. 11 da Lei n. 9504/97- inserido pela Lei n. 12034/2009).

A VERDADE. O que essa regra quer dizer é que, quanto à prestação de contas de campanha, só não terá a certidão de quitação (documento necessário para ser candidato) quem deixar de apresentar as contas, não importando se a Justiça Eleitoral aprova ou rejeita as contas. Aí ficou muito fácil se candidatar. Na prática, basta levar um amontoado de papéis (recibos, notas fiscais e por aí vai) e pronto. É um verdadeiro “faz de contas”, não passa de um teatro, uma ficção!

Essa medida que tem como idealizadores os nossos deputados e senadores permite que pessoas mesmo com contas recusadas em virtude, por exemplo, de falsificação de notas fiscais, existência de ‘caixa 2’ na campanha, financiamento oriundos de fontes proibidas, entre outros motivos, esteja apto a ser um representante legítimo do povo. Claro que restaria a responsabilidade penal e civil desses candidatos, mas até o julgamento das ações e recursos, e sabe-se o quanto isso demora, eles já seriam nossos mandatários e teriam praticado um monte de atos.

Daí o questionamento: Contas de campanha eleitoral: uma mera formalidade? Do jeito que tá é quase isso, pois o maior avanço nesse ponto foi com a resolução do TSE, que caiu por terra com a edição da lei da Mini Reforma. Afinal, na hierarquia das normas, lei ordinária manda mais que resolução e ponto final, embora em matéria eleitoral tenha se pacificado que resoluções do TSE equivalem à lei ordinária.

SEM IMPUNIDADE. É claro que ainda existe uma luz no fundo do túnel para punir os espertinhos que se utilizarem de subterfúgios durante a campanha eleitoral, não com o imediatismo propalado pela Resolução do TSE. O Ministério Público pode ajuizar uma Ação de Investigação Eleitoral, por exemplo, caso verifique estar presente um abuso de poder econômico ou gasto irregular de campanha. É que o § 4o do art. 22 da Lei n. 9.504/97 determina que em sendo as contas rejeitadas, serão encaminhadas cópias dos autos para o Ministério Público tomar as devidas providências. Pelo menos há uma esperança de punição aos que querem ludibriar.

TSE INSISTE NO IMPEDIMENTO AS REJEITADOS DE 2008. Apesar do surgimento dessa nova regra, o TSE anda querendo sustentar o entendimento que lançou na Resolução de 2008. Estão analisando a abrangência da certidão de quitação eleitoral para o registro dos candidatos que tiveram as contas de campanha de 2008 rejeitadas. A tese que tá vencendo é a de que na interpretação da norma que nega a certidão aos que não apresentarem as contas estão contemplados os casos de rejeição das contas. Dos 7 ministros, 3 insistem nessa tese (Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio e Cármen Lúcia). Até agora, somente o ministro Arnaldo Versiani afirmou que não abrange a rejeição. Nos próximos dias o julgamento será retomado com a apresentação do voto-vista do ministro Aldir Passarinho.

Com a devida vênia ao entendimento que está prevalecendo no TSE, mas a norma é clara em negar certidão de quitação eleitoral somente para os que não apresentaram as contas de campanha. Repito, estamos diante de uma lei de um lado e uma resolução de outro. O que vale mais? Há alguma inconstitucionalidade na lei ou algo do tipo? De acordo com a pirâmide de hierarquização das normas, ao que me parece, a lei está acima. Fazer o que né !!!!! Mas vamos ver o que os ilustres julgadores da alta corte eleitoral decidirão. Não estou a defender o conteúdo da lei. Creio piamente que fora um retrocesso aos anseios da sociedade. Mas, de acordo com o nosso ordenamento jurídico brasileiro não é possível aceitar entendimento diverso, sob pena de invalidarmos o processo natural de organização e validação das normas.

A título de curiosidade, de acordo com a Resolução sobre prestação de contas nas Eleições de 2008, somente as contas desaprovadas eram remetidas ao Ministério Público Eleitoral para providências. Agora, na Resolução das Eleições de 2010 (n. 23.217/2010), tanto as contas desaprovadas, quanto as julgadas como não prestadas, terão as cópias dos respectivos processos remetidos ao Ministério Público Eleitoral para as medidas cabíveis. Um avanço, pois só ia para o Órgão Ministerial os casos de contas rejeitadas.

RONDÔNIA. Alguns políticos tiveram as suas contas rejeitadas pela Justiça Eleitoral Rondoniense nas últimas Eleições Municipais. Bom, pela letra da novel lei estão livres para concorrer em 2010. O que temos até agora é que a Lei 12.034/2009 representou uma plena anistia aos que tiveram suas contas eleitorais desaprovadas no páreo de 2008. Logo, quanto à condição de elegibilidade: quitação eleitoral, a situação aparenta tranquila. O negócio só vai pegar mesmo para quem deixou de apresentar as contas. Aí não tem jeito. Todavia, vamos ver o que o TSE dirá nos próximos dias.

Edirlei Barboza Pereira de Souza

Bacharel em Direito

Técnico Judiciário do TRE-RO

Pós-Graduado em Direito Eleitoral e Processo Eleitoral

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