quinta-feira, 13 de maio de 2010

Debate eleitoral sem clareza sobre estabilidade afeta expectativas financeiras



Os candidatos à Presidência da República têm pouco tempo para escolher entre uma política que visa favorecer o desenvolvimento através da manutenção da estabilidade monetária e uma política que visa apenas manter a demanda permanentemente aquecida, maximizando o crescimento econômico no curto prazo.

Um dos dois grandes legados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva - a estabilidade monetária e o crescimento exuberante em 2010 - será preterido logo no primeiro ano do novo governo e as projeções de indicadores macroeconômicos confirmam que o mercado confia na defesa da estabilidade.

Há quase quatro meses, a projeção para expansão do Produto Interno Bruto (PIB) em 2011 está plantada em 4,5% na pesquisa Focus, divulgada semanalmente pelo Banco Central. O arrefecimento do ritmo de atividade será acompanhada pela convergência de inflação para o centro da meta no cenário de taxa de câmbio comportada e Selic forte.

A consistência desses indicadores, no tempo, dependerá, contudo, da definição de compromissos dos principais candidatos a presidente. Na falta de posicionamentos claros, as expectativas sofrerão ajustes e os ativos financeiros, por ora afetados basicamente pelo cenário externo, poderão entrar em zona de turbulência, atropelando o calendário eleitoral.

"O racional é o próximo presidente pagar um pedágio monetário especialmente no primeiro ano de gestão e tentar fazer mudanças importantes em busca da sustentação do desenvolvimento", defende Carlos Melo, cientista político e professor do Insper.

"É claro que haverá pressões políticas e críticas a qualquer candidato que defenda essa agenda e chegue ao Planalto. Mas estabilidade tornou-se um capital político. Estabilidade é mais que um rótulo econômico. Afinal, foi a estabilidade monetária a responsável pela inclusão de 30 milhões de pessoas no mercado de consumo", avisa.

Para bancar o desenvolvimento com inclusão social, o próximo presidente deverá ser tão conciliador quanto o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o presidente Lula, entende o professor do Insper, que questiona, entretanto, se os dois principais pré-candidatos à Presidência conseguirão "jogar este jogo".

"Fazer reformas visando maior capacidade de investimento e ajuste fiscal significa administrar conflitos e isso é difícil", diz Melo. "Se Dilma Rousseff chegar à Presidência devemos ter continuidade de gestão, mas com poder mais fraco de negociação. Se José Serra chegar à Presidência, ele pode ser demasiadamente forte num sistema que exige muito jogo de cintura".

A manutenção do aperto monetário está no preço dos ativos financeiros, o que não significa dizer que a economia levará um tombo em 2011. A economista Luiza Rodrigues, do Santander, lembra que a estabilidade monetária garante as bases do crescimento sustentado num prazo maior. "A experiência de muitos países mostra isso. Claro que o Brasil precisa fazer reformas, mas a estabilidade é condição determinante no médio e longo prazos", avalia.

O Santander projeta taxa Selic de 12% no final de 2010 e de 2011, sinalizando portanto a expectativa de continuidade do aperto monetário. E Luiza esclarece que a intenção da política monetária é ajustar a economia para o crescimento consistente. "A economia vai desacelerar, mas isso não é crise", completa.

O ex-presidente do BC Affonso Celso Pastore, da A.C.Pastore & Associados, concorda que o aperto monetário prossegue, dado o elevado aquecimento da economia e o comportamento da inflação. Na sua visão, esse cenário básico impõe que pelo menos nas próximas três reuniões o Comitê de Política Monetária (Copom) prossiga no atual ciclo de elevação de 0,75 ponto percentual, com a Selic chegando a 11,75%.

Mas por considerar que pairam dúvidas sobre os próximos passos da autoridade monetária, Pastore construiu três cenários alternativos: de aumento da Selic acima e além da taxa de 11,75% ao ano; de elevação dos recolhimentos compulsórios visando ativar o canal do crédito; e o de que o Brasil seja afetado em maior grau pela atual crise na Europa.

No primeiro cenário, explica Pastore, o governo mantém estímulos fiscais elevados, e estimula a expansão do crédito por parte de bancos oficiais. Neste caso, que é muito provável, o cenário de mercado é excessivamente otimista, e a taxa Selic terá que sofrer elevações adicionais.

No segundo cenário, o BC eleva o compulsório sobre depósitos. Este instrumento potencializa os efeitos da alta da Selic, mas é apenas complementar ao aumento de juro, não impedindo que a Selic avance a 11,75%.

No terceiro cenário, Pastore admite que a crise europeia, por ora adiada pelo anúncio de um pacote de US$ 1 trilhão, e de mudança na conduta do Banco Central Europeu, possa atingir mais pesadamente o Brasil no futuro, mas sem efeitos imediatos.
 
Autor: Angela Bittencourt, de São Paulo
Fonte: Valor Econômico

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